top of page

Amolecimento Vicat: Guia Técnico e Aplicações Práticas no Processamento de Polímeros

  • Sérgio Mello
  • 10 de nov. de 2024
  • 5 min de leitura

Em 29 de setembro, iniciei uma série de discussões técnicas sobre a interpretação de folhas de dados (technical datasheet), apresentando como exemplo um grade específico de polipropileno. Entre os diversos parâmetros abordados, destacou-se uma característica térmica fundamental: o AMOLECIMENTO VICAT. Este artigo aprofunda esse tema essencial, oferecendo uma análise técnica detalhada e suas implicações práticas no processamento de polímeros.


1. Método de Ensaio ASTM D1525: Aspectos Técnicos

O ensaio de amolecimento Vicat é um método padronizado que determina a temperatura na qual um material termoplástico começa a amolecer significativamente sob condições específicas. De acordo com a norma ASTM D1525, o método apresenta as seguintes características:

Equipamento e Configuração


  • Agulha de Penetração: Seção circular de 1,0 mm² ±0,015 mm²

  • Carga Aplicada: Método A: 10N ±0,2N Método B: 50N ±1N

  • Taxa de Aquecimento: 50°C ±5°C por hora

  • Corpo de Prova: Dimensões mínimas de 3mm x 10mm x 10mm


Procedimento Detalhado


  1. Preparação da Amostra: Corte preciso nas dimensões especificadas Superfícies paralelas e livres de defeitos Condicionamento prévio em ambiente controlado (23°C ±2°C, 50% ±5% UR)

  2. Configuração do Ensaio: Posicionamento da amostra no suporte Verificação do nivelamento Zeragem do indicador de penetração

  3. Execução: Imersão em banho térmico Monitoramento contínuo da temperatura Registro automático do ponto de penetração

  4. Análise dos Resultados: Mínimo de três amostras por material Cálculo da média e desvio padrão Validação conforme critérios da norma


Comparativo entre Polímeros Comerciais

Termoplásticos Commodities:



Figura 1 - Comparativo de temperarura de AMOLECIMENTO VICAT - plasticos "comodities"

Figura 2 - Comparativo de temperarura de AMOLECIMENTO VICAT - plásticos de "engenharia"


Fatores que Influenciam o Amolecimento Vicat


A temperatura de amolecimento Vicat é fundamentalmente determinada pela composição do material polimérico, sendo significativamente influenciada pela presença de cargas minerais e aditivos. Conforme demonstrado por Canevarolo (2006), a incorporação de cargas como fibra de vidro pode elevar a temperatura Vicat em até 40°C devido ao efeito de ancoragem molecular, enquanto plastificantes tendem a reduzi-la por diminuírem as forças intermoleculares entre as cadeias poliméricas.

As condições de processamento, particularmente a temperatura do molde e taxa de resfriamento, são cruciais para o comportamento térmico final do produto. Manrich (2013) explica que um resfriamento mais lento permite maior organização das cadeias moleculares em polímeros semicristalinos, resultando em maior cristalinidade e, consequentemente, maior temperatura Vicat. Adicionalmente, as tensões residuais geradas durante o processamento podem levar a variações significativas nos valores obtidos.

A estrutura molecular do polímero base constitui o terceiro pilar de influência, onde o peso molecular e o grau de ramificação das cadeias são determinantes. Segundo Mano e Mendes (1999), polímeros com maior peso molecular e menor grau de ramificação tendem a apresentar temperaturas Vicat mais elevadas, como evidenciado na comparação entre PEAD e PEBD, onde o primeiro apresenta temperatura de amolecimento significativamente superior devido à sua estrutura molecular mais linear e organizada.


2. Correlação com a Microestrutura


A temperatura de amolecimento Vicat está intrinsecamente relacionada com a estrutura molecular do polímero:


Fatores de Influência


  • Cristalinidade: Maior percentual cristalino = maior temperatura Vicat

  • Peso Molecular: Cadeias mais longas = maior resistência ao amolecimento

  • Ramificações: Menor quantidade de ramificações = maior temperatura Vicat

  • Aditivos: Cargas minerais e reforços podem aumentar significativamente o ponto Vicat


Relação com Outras Propriedades


A temperatura de amolecimento Vicat apresenta correlações significativas com diversas propriedades fundamentais dos polímeros. No âmbito das propriedades mecânicas, Brydson (1999) estabelece uma relação direta entre a temperatura Vicat e o módulo de elasticidade do material - polímeros com maior módulo tendem a apresentar temperaturas de amolecimento mais elevadas devido à maior resistência à deformação molecular. Esta correlação se estende também à resistência à tração, onde materiais com maior resistência mecânica geralmente exibem pontos Vicat superiores, reflexo da maior coesão entre as cadeias poliméricas.


No contexto das propriedades térmicas, Michaeli (1995) demonstra que a temperatura de amolecimento Vicat geralmente se posiciona entre a temperatura de transição vítrea (Tg) e a temperatura de fusão cristalina (Tm) em polímeros semicristalinos. Para polímeros amorfos, o ponto Vicat frequentemente se encontra alguns graus acima da Tg, servindo como um indicador prático da temperatura máxima de serviço.

O coeficiente de expansão térmica também apresenta uma relação inversa com a temperatura Vicat - materiais com menor expansão térmica, especialmente aqueles com alto teor de cargas minerais, tendem a manter sua integridade estrutural até temperaturas mais elevadas, resultando em valores Vicat superiores.


3. Importância Prática para Transformadores

Aplicações Críticas

O ponto Vicat é uma ferramenta valiosa que ajuda operadores e processadores a tomarem decisões importantes durante a produção de peças plásticas. Na prática diária da fábrica, este valor serve como guia seguro para definir quando podemos extrair a peça do molde. Por exemplo, quando trabalhamos com uma peça de nylon (PA66), que tem ponto Vicat de 240°C, precisamos esperar o material resfriar até cerca de 200°C para uma extração segura. Se tentarmos desmoldar em temperaturas maiores, corremos o risco de deformar, fura a péça através dos pinos ou gavetas de extração ou até da peça ter problemas dimensionais.


Para quem trabalha com peças automotivas sob capô, o ponto Vicat é especialmente importante. Imagine uma peça que vai ser instalada perto do motor, onde a temperatura pode chegar a 120°C. Neste caso, precisamos usar um material com ponto Vicat bem acima dessa temperatura para garantir que a peça não vai deformar durante o uso. É como uma margem de segurança - quanto maior a diferença entre a temperatura de trabalho e o ponto Vicat, mais seguro estamos.


Na hora de ajustar a máquina injetora, o ponto Vicat também nos ajuda a definir os parâmetros corretos de resfriamento. Em materiais como PBT ou POM, que são muito usados em peças técnicas, precisamos resfriar o material de forma adequada para garantir que ele mantenha sua forma nas temperaturas de uso. Por isso, ajustamos o tempo de resfriamento e a temperatura do molde considerando o ponto Vicat do material - quanto maior este valor, mais cuidadoso precisamos ser com o resfriamento para garantir peças de qualidade.


Outros exemplos práticos:


Caso 1: Indústria Automotiva


  • Aplicação: Carcaça de farol automotivo

  • Material Original: PC/ABS

  • Desafio: Deformação em dias quentes

  • Solução: Reformulação com grade de PC com maior temperatura Vicat

  • Resultado: Eliminação de deformações em campo


Caso 2: Eletroeletrônicos


  • Aplicação: Conectores elétricos

  • Material: PBT com 30% de fibra de vidro

  • Requisito: Resistência a soldagem

  • Temperatura Vicat: 220°C

  • Benefício: Permite processo de soldagem wave soldering


Caso 3: Embalagens


  • Aplicação: Garrafas para bebidas quentes

  • Material: PET modificado

  • Temperatura Vicat: 85°C

  • Desafio: Aumentar resistência térmica

  • Solução: Cristalização induzida no processo



4. Conclusão


A temperatura de amolecimento Vicat é uma propriedade fundamental que nos ajuda diariamente na tomada de decisões no processamento de polímeros, desde a extração segura das peças até a definição de parâmetros de processo.


Para se manter atualizado sobre este e outros temas técnicos relevantes para a indústria de transformação de plásticos, convido você a visitar meu site www.shtmindustrial.com.br, onde disponibilizo regularmente artigos técnicos, dicas práticas e conteúdos exclusivos voltados para a otimização de processos e qualidade em transformação de termoplásticos. 


Agradeço sua leitura e espero que este artigo tenha contribuído para esclarecer a importância prática desta propriedade que, apesar de parecer simples, tem impacto significativo na qualidade de nossas peças e na produtividade de nossas fábricas.


Boa semana! Go ahead!



ASTM D1525-17. Standard Test Method for Vicat Softening Temperature of Plastics. West Conshohocken: ASTM International, 2017.

BRYDSON, J. A. Plastics Materials. 7. ed. Oxford: Butterworth-Heinemann, 1999.

CANEVAROLO JR., Sebastião V. Ciência dos Polímeros: um texto básico para tecnólogos e engenheiros. 2. ed. São Paulo: Artliber, 2006.

CRAWFORD, R. J. Plastics Engineering. 3. ed. Oxford: Butterworth-Heinemann, 1998.

MANO, E. B.; MENDES, L. C. Introdução a Polímeros. 2. ed. São Paulo: Blucher, 1999.

MANRICH, S. Processamento de Termoplásticos. 2. ed. São Paulo: Artliber, 2013.

MELLO, Sérgio H. T. Como interpretar e validar os dados de folha de dados (technical datasheet) em termoplásticos? LinkedIn, 29 set. 2023. Disponível em: https://www.linkedin.com/feed/update/urn:li:ugcPost:7246274596369272832/. Acesso em: 10 nov. 2024.


 
 
 

留言


bottom of page